Portugal no mapa espacial
Foi recentemente anunciado o reforço financeiro da participação nacional nos programas da Agência Espacial Europeia (ESA), organismo da qual Portugal faz parte desde 2000. Até 2022, o Governo irá aumentar em mais de 40% o orçamento público inicialmente previsto para a ESA, de um total de 71 milhões de euros para 102 milhões até 2022. Ou seja, num contexto de consolidação das contas públicas durante os próximos anos, o Governo dá um sinal claro de que a Ciência, nomeadamente o “Espaço”, será uma das áreas prioritárias de investimento público para a próxima década.
Mas qual a importância do investimento nacional nesta área, para um país que está longe de estar na fronteira tecnológica e que é moderadamente inovador à escala europeia? Podemos apontar duas razões (pelo menos) para que Portugal reforce a sua aposta no Espaço e queira ter uma presença e posição mais visível e ativa: uma de natureza económica e outra estratégica.
Em termos económicos, o investimento público na ESA traduz-se, em primeiro lugar, na criação de oportunidades de financiamento e de desenvolvimento tecnológico para o tecido económico nacional. Isto porque o contributo financeiro de Portugal na ESA, que consiste na subscrição dos chamados “programas obrigatórios” e dos “programas opcionais”, retorna posteriormente, e na totalidade, em contratos para as empresas e entidades do sistema científico e tecnológico nacional.
De acordo com um estudo da Clama Consulting de 2011, no período 2000-2009 foram mais de 1000 os projetos nacionais financiados pela ESA – envolvendo empresas, Universidades, centros de I&D, etc., e de forma colaborativa, muitas vezes –, num montante de quase 100 milhões de euros, praticamente o mesmo valor investido pelo Estado nesse período na ESA. Ou seja, um retorno do investimento público em torno dos 100% para a economia nacional.
Em segundo lugar, o impacto económico traduz-se em mais exportações e na internacionalização das entidades nacionais envolvidas na área do Espaço. Por exemplo, em 2014 as exportações do setor cresceram cerca de 18% (cerca de 5 vezes mais que a taxa de crescimento de exportações nacionais desse ano), num total de 70 milhões de euros. Este facto é importante porque estas exportações são sobretudo de bens de alta-tecnologia, contribuindo para melhorar esta componente na balança comercial.
Finalmente, o impacto económico é também visível na criação de uma base qualificada de recursos humanos na área espacial, não só pela dinâmica criada pelos projetos desenvolvidos desde 2000, mas também pelos estágios proporcionados pela ESA a investigadores nacionais (cerca de 130 entre 2000-2009).
Em termos estratégicos, Portugal não pode ficar para trás nos avanços que estão a ocorrer na área espacial à escala global e que se prevê que sejam aprofundados nos próximos anos. O reforço da participação na ESA é importante para que as nossas empresas e entidades de investigação acedam a novo conhecimento, tecnologias e recursos e que estejam posicionadas na linha da frente dos principais projetos espaciais internacionais. Depois, reforça a intenção do Governo de criar um centro de investigação espacial nos Açores, que poderá acelerar o desenvolvimento das atividades ligadas ao espaço na indústria nacional.
Por fim, pode colocar Portugal como um dos polos europeus de empreendedorismo espacial, tirando partido da recém-criada incubadora da ESA em Portugal – a ESA BIC Portugal, gerida pelo Instituto Pedro Nunes, envolvendo também a DNA Cascais e a UPTEC, no Porto. Esta incubadora pretende apoiar a criação de startups que desenvolvam soluções com aplicação industrial e comercial a partir de tecnologia espacial.
Em resumo, esta nova ambição de Portugal constitui um reforço da visão de longo-prazo do ministro da Ciência e Tecnologia Mariano Gago, que ainda no século passado, no Governo de António Guterres, foi o principal responsável pelo início desta aventura de colocar Portugal no mapa espacial.
(Artigo publicado originalmente em Jornal Económico, 6 de dezembro de 2016)