Política de inovação e criação de novos mercados
Quando falamos em “política de inovação” estamos a falar de iniciativas públicas com a capacidade de influenciar o processo de inovação, incluindo as que atuam na sua difusão pela sociedade. Após mais de meio século de estudos sobre inovação, não é ainda hoje consensual entre os economistas que tipo de ação pública deve existir nem a forma ou a extensão em que essa ação deve ocorrer. Estas divergências influenciam o próprio processo de formulação política, com reflexos em posições mais ou menos extremadas sobre a intervenção do “Estado” no estímulo à inovação.
Resumidamente podemos mencionar dois grupos de razões que a ciência económica aponta para que o Estado intervenha no estímulo à inovação. Uma advém da chamada “visão linear” da inovação, em que esta é vista sobretudo como um produto das atividades de investigação e desenvolvimento (I&D). Nesta visão, existem “falhas de mercado” (por exemplo, a criação de novo conhecimento gera externalidades que são difíceis de apropriar por quem as gera) que justificam a necessidade de existirem políticas públicas de apoio às atividades de I&D. Um exemplo típico de política é o quadro regulatório de proteção de propriedade inteletual.
Um outro grupo de razões está ligado com uma visão sistémica da inovação (“não linear”, portanto), na qual esta é o resultado de um processo complexo, dinâmico e interativo. Aqui, vários atores intervêm na criação de inovações (utilizadores, universidades, empresas, etc.), influenciando-se mutuamente e em várias fases do processo de inovação, como se de um sistema de tratasse. Nesta perspetiva, podem existir problemas de funcionamento desse sistema (problemas de interação entre os agentes económicos, de capacitação, etc.), mas que podem ser atenuados pela ação intencional da política pública. A política de clusters é um exemplo que se enquadra nesta visão.
Contudo, há outros motivos pelo qual o Estado deve intervir no processo de inovação. Esses motivos relacionam-se com a procura de respostas para problemas económicos e sociais que surgiram nas últimas décadas, aos quais as tradicionais respostas se mostram insuficientes. Nesta visão, defendida por economistas de nova geração, o Estado não deve ser um ator passivo nem um mero regulador da atividade económica; pelo contrário, deve ser ele próprio empreendedor e inovador. Os recursos públicos devem ser direcionandos para áreas por si consideradas estratégicas (e onde a iniciativa privada não investiu ainda), estimulando a criação de novos mercados. Segundo este argumento, o Estado deve estimular a inovação através de uma visão de longo-prazo no que respeita a objetivos políticos pré-definidos, suportada por uma estratégia clara de procura pública.
Esta última visão pode beneficiar economias de menor dimensão, como a portuguesa. Dadas as caraterísticas estruturais do nosso setor privado (reduzida dimensão das empresas, défices de qualificações, etc.), uma procura pública orientada para a inovação pode gerar um efeito mobilizador sobre a economia. O programa de Mobilidade Elétrica ou o SIMPLEX (lançados há uma década) são bons exemplos que têm gerado retorno económico e social para o país. Para os próximos anos, a requalificação urbana, as “cidades inteligentes”, a produção de veículos elétricos ou os serviços públicos de nova geração poderão constituir desafios da política de inovação em Portugal, com potencial impacto na criação de novos mercados à escala global.
(artigo publicado originalmente em Jornal Económico, 27 de setembro de 2016)