O mau “bom aluno”
O Ecofin decidiu confirmar a aplicação de sanções a Portugal devido ao “mau comportamento” do Governo em 2014 e 2015 em termos de finanças públicas. Sendo verdade (défice de 3,2% em 2015), esta decisão levanta algumas questões pertinentes. Primeiro, sobre o timing escolhido. Desde 1999 vários países violaram o limite dos 3%: França, 11 vezes ou a Alemanha, 5 vezes. Depois, qual a razão da não aplicação de multas a outros países que não cumpriram esse limite em 2015 (França e Eslováquia)? Finalmente, porque não se aplicam sanções a outros incumprimentos, como ao limite de 60% do PIB de dívida pública (vários países) ou ao limite de 6% de excedente comercial, que a Alemanha infringe sistematicamente desde 2011? Não é, portanto, de admirar a desconfiança e descontentamento de muitos cidadãos europeus em relação às pouco transparentes decisões europeias.
A decisão de aplicar agora sanções (mesmo uma “sanção zero”) é a admissão de dois factos. Por um lado, evidencia que a implementação de medidas de austeridade não foi a receita adequada para equilibrar as contas públicas. Por outro lado, coloca em causa a competência dos técnicos da ‘troika’, que entre 2014/15 acompanharam a nossa execução orçamental através das habituais visitas regulares. ‘Troika’ essa que elogiou o trajecto de consolidação de Portugal e o apelidou de “bom aluno”. É, portanto, incompreensível sancionar um “bom aluno”.
Uma “sanção zero”, ou “a tender para zero”, parece ser o mais provável. As expectativas têm sido geridas nesse sentido, quer por parte das instituições europeias quer dos decisores políticos nacionais. É uma solução que “salva a face” das instituições europeias, mostrando que desta vez está a cumprir as regras estabelecidas. Pretende também criar pressão sobre actuais governos que romperam com um pensamento ideológico de austeridade e salários baixos (como Portugal), numa última tentativa de mostrar que “there is no alternative”. Em termos práticos, uma “sanção zero” permite ao Governo português continuar a implementação do PEC e PNR, retirando o país do procedimento por défice excessivo em 2016, como apontam as projeções internacionais, conciliando uma trajectória de sustentabilidade orçamental com a dinamização da economia, assente na inovação e conhecimento.
Artigo publicado originalmente em Diário Económico.