A “fat tax”: uma oportunidade para as empresas
Uma das novidades que poderá ser incluída no Orçamento de Estado para 2017 é o agravamento fiscal de alguns produtos nocivos à saúde, nomeadamente os que contêm excesso de sal ou de açúcar. Embora se trate de uma medida que trará alguma receita para o Estado, o seu principal objetivo será o de induzir comportamentos mais saudáveis nos cidadãos.
Há quem defenda que o Estado não se deve imiscuir nas escolhas que as pessoas fazem, argumentando com a liberdade individual de escolha e de ação (o economista Milton Friedman, da “escola de Chicago”, foi um dos expoentes máximos desse argumento). Acontece que não vivemos num mundo perfeito; as pessoas têm diferentes níveis de informação e de conhecimento (assimetria de informação), o que afeta o seu processo de tomada de decisão. Por exemplo, nem todas as pessoas estão cientes dos malefícios para a sua saúde do consumo de produtos com excesso de açúcar ou de sal (as sedutoras campanhas de marketing desses produtos nem sempre ajudam…). Ao consumir estes produtos, as pessoas obtêm uma satisfação imediata, mas poderão estar a hipotecar a sua saúde a prazo. Desta forma, torna-se necessária existência de mecanismos que nivelem o conhecimento e a informação a que as pessoas têm acesso (por exemplo, através da educação), que promovam comportamentos responsáveis, em benefício de toda a sociedade (por exemplo, através de ações de prevenção ou de medidas fiscais).
É neste sentido que se enquadra a proposta em estudo de uma possível taxa adicional em Portugal sobre os produtos ricos em sal e açúcar, dado que sabemos hoje que estas são duas das principais causas de doenças e de mortes em todo o mundo. Um estudo de 2015 do norte-americano Institute for Health Metrics and Evaluation conclui que aquilo que comemos mata mais do que o álcool ou o tabaco. Por exemplo, estima-se que mais de 2 milhões de pessoas por ano acabem por morrer devido ao consumo excessivo de sal. Investigadores de Harvard mencionam que só as bebidas com excesso de açúcar provoquem a morte de 180 mil pessoas em todo o mundo. Faz sentido, por isso, que o Estado em Portugal adote medidas que moderem e diminuam o consumo destas duas substâncias, associadas à obesidade, diabetes ou a problemas coronários. A prazo, terá impacto no sistema de saúde (menos despesas com tratamento de doenças e com medicamentos), nas empresas (menor número de trabalhadores doentes) e na segurança social (menos despesas com baixas ou invalidez).
Espera-se que uma taxa adicional sobre produtos com excesso de açúcar e sal diminua o seu consumo (dado que são produtos sensíveis ao preço), sendo o consumo direcionado para produtos substitutos (com caraterísticas similares, mas com menor teor de sal e de açúcar). E aqui aparece uma oportunidade de mercado para as empresas do setor agro-alimentar que operam em Portugal: colocar no mercado novos produtos, mais saudáveis, que satisfaça o gosto daqueles que deixaram de consumir os produtos que foram alvo de agravamento fiscal. Ou seja, uma possível “fat tax”, além de induzir comportamentos mais saudáveis nos cidadãos, poderá estimular inovações (novos produtos, novos conceitos) nas empresas ligadas a setor agro-alimentar. Assim seja.
(artigo publicado originalmente em Jornal Económico, 11 de outubro de 2016)